sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Encontro de pesquisadores de História e Geografia do Caminho Novo da Estrada Real: impressões

A ideia da realização de um encontro de pesquisadores do Caminho Novo foi apresentada à Diretoria Executiva da ACAHMPAS pelo sócio Luiz Mauro Andrade da Fonseca, em julho de 2010. Ele propunha uma parceria entre a ACAHMPAS e o Centro de Memória Belisário Pena (CMBP) para a produção do evento. Após algumas reuniões, o I Encontro de pesquisadores de História e Geografia do Caminho Novo foi sendo desenhado.
A atenção a esse tema justifica-se pela importância do Caminho Novo para a identidade da região. O Caminho Novo, incorporado por Garcia Rodrigues Pais a partir de 1698, exerceu papel crucial na ocupação e no desenvolvimento da capitania de Minas Gerais. A incorporação dessa rota viabilizou o abastecimento da região aurífera e a saída de ouro e diamantes, contribuindo sobremaneira para a fixação de uma sociedade urbanizada e mais estável.
Além de integrar diretamente as capitanias de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, através de circuitos mercantis, o Caminho Novo impulsionou o desenvolvimento das regiões por que passava, estimulando as atividades agrícolas e comerciais. Inúmeras povoações, posteriormente alçadas à categoria de arraiais e vilas, tiveram sua origem nos pousos, ranchos, roças e registros estabelecidos às margens do Caminho.
A relevância do Caminho Novo no processo de constituição da região e seu entorno torna imprescindível e inadiável a realização e a divulgação de pesquisas que se ocupam do tema. Tal iniciativa, ao reunir pesquisadores para debater a construção histórico-geográfica do Caminho Novo, seguramente, contribuirá para um melhor conhecimento historiográfico sobre o tema, especialmente porque pretende ser o ponto de partida para um contínuo estudo do Caminho Novo e, conseqüentemente, da história regional.
Foi escolhido como temática principal do primeiro encontro o itinerário do Caminho Novo na região. Definiram-se, ainda, como objetivos reunir estudiosos de história e geografia regionais para mostra de trabalhos e troca de informações; incentivar pesquisas regionais sobre o Caminho Novo, estimulando a construção de conhecimento sobre o tema; formar, a partir do evento, uma rede regional de pesquisadores sobre a história e a geografia do Caminho Novo.
É importante ressaltar que o evento, que se pretende seja realizado anualmente, fosse informal e de baixo custo, ocorrendo nos municípios que compõem o dito caminho. Dessa forma, coube a cada participante arcar com as suas despesas pessoais, sendo cobrada apenas taxa de inscrição de R$20,00 para as despesas do encontro. Inclusive as despesas com o transporte para o passeio pelo Caminho Novo foram custeadas por cada participante.
O evento ocorreu nos dias 24 e 25 de setembro de 2010. No dia 24 de setembro, foram apresentadas seis comunicações, a palestra de abertura sobre Garcia Rodrigues e a mesa redonda sobre os Arquivos Públicos Regionais, com representantes de todos os arquivos da região. Dois dos palestrantes, que falariam sobre o Caminho Novo em Juiz de Fora e Simão Pereira, não compareceram.
Na sexta-feira, 38 pessoas participaram do evento, que contou com a presença de onze sócios da ACAHMPAS. No dia 25 de setembro, dezenove pessoas, capitaneadas pelo Sr. Francisco Rodrigues de Oliveira, embrenharam-se nos trajetos do Caminho Novo. Iniciou-se a caminhada pela Igreja de Nossa Senhora da Piedade, marco fundador do núcleo urbano de Barbacena. Depois de visitar o Arquivo Histórico Municipal, a pequena caravana começou a palmilhar o Caminho Novo pelo bairro Santo Antônio, antigo Alto do Cangalheiro, passando pela Roselanche e alcançando Alfredo Vasconcelos, sempre contando com as observações e esclarecimentos do Sr. Francisco.
Após o almoço, o grupo seguiu para a Fazenda do Registro Velho. Certamente, a impressão que tiveram ao chegarem ao antigo Registro distingue-se profundamente daquela relatada pelos inúmeros viajantes que por lá passaram no século XIX.
A vigorosa produção que empregava dezenas de escravos, as roças de milho, a fábrica de tecidos tão elogiada pelos viajantes, o pouso para tropas intensamente freqüentado são reminiscências do passado. A imagem que se descortina ao viajante do século XXI é absurdamente chocante e lamentável. O que hoje se vê da antiga fazenda é um amontoado de ruínas. A maior parte do telhado já caiu bem como algumas paredes. Portanto, a derrocada definitiva é apenas uma questão de tempo.
O desânimo e a tristeza só não tomaram conta de todos porque, depois de deixarmos o Registro Velho, partimos para Antônio Carlos, ansiosos por nos depararmos com a histórica Borda do Campo. E a fazenda da Borda descortinou-se imponente, por trás do secular muro de pedras. Foi emocionante estar em contato com o marco fundador da região, corporificado pelo peão de pedra fincado na entrada da propriedade, demarcando a posse da sesmaria, datada de 1713. Afinal, a ocupação das terras da Borda do Campo representou o ponto de partida do povoamento da região, emblemática de todo o processo de ocupação.
Visitar a fazenda da Borda do Campo foi uma experiência fantástica. Foi uma oportunidade única conhecer a singela capela “bandeirista” de Nossa Senhora da Piedade, ornamentada com seu relógio de pedra e o velho sino, que certamente marcaram o ritmo da vida de dezenas de gerações que lá viveram. Não foi possível conhecer o interior da capela, que passa por um processo de restauração, nem o interior da casa da fazenda. Contudo, percorrer seus bem cuidados jardins e pátios, sua varanda e a antiga cozinha freqüentada por escravas e sinhás, observar sua arquitetura característica, foi extremamente válido.
Para além da emoção de conhecer um lugar tão importante e significativo quanto a Fazenda da Borda, é fundamental registrar que a visita à Borda foi também alentadora. Depois de nos depararmos com a situação deplorável do Registro Velho, foi animador constatar as excelentes e louváveis condições em que se encontra a fazenda. O cuidado e o zelo dispensados pela proprietária são exemplos de conservação e preservação.
Para fechar com chave de ouro nossas andanças pelo Caminho Novo, restava-nos o último destino: uma parada na cidade de Antônio Carlos. Fomos recebidos na Casa de Cultura de Antônio Carlos pela prefeita Cristina, pela Secretária de Cultura Rosemary e por um belo coral. À moda dos antigos moradores do Caminho Novo, que tão bem recebiam os viajantes, não faltou um delicioso lanche. Não se pode deixar de registrar e agradecer tão calorosa e simpática recepção.
Finalizado o I Encontro de Pesquisadores do Caminho Novo, podemos aventar alguns resultados. Em primeiro lugar, o evento conseguiu reunir pessoas interessadas no estudo do Caminho Novo, não se limitando exclusivamente ao meio acadêmico, contribuindo, dessa forma, para a ampliação e divulgação do conhecimento sobre o tema. Tal iniciativa permite a aproximação dos estudos acadêmicos de um público externo à universidade, porém profundamente interessado e preocupado com a história, a memória e a identidade da região. As comunicações e palestras, por outro lado, possibilitaram refletir sobre a importância fundamental do Caminho Novo para o desenvolvimento de Minas e da região, sobre a territorialidade, a espacialidade, os itinerários, a ocupação e as atividades relacionadas ao Caminho Novo. Por fim, palmilhar o Caminho Novo e tentar recuperar seus antigos trajetos faz pensar sobre as perspectivas de localização das antigas trilhas, levando-se em conta a topografia, a hidrografia e os antigos vestígios.
A experiência desse primeiro encontro faz-nos concluir que nos resta muito a desbravar, seja em termos de itinerários, seja quanto às perspectivas de estudo. Fica-nos também a certeza de que essa iniciativa, ao ampliar o conhecimento sobre o Caminho Novo, poderá gerar ações da sociedade no sentido de preservar a história e a memória da região. Resta-nos continuar a viagem pelo Caminho Novo.
  Edna Maria Resende













Um comentário:

  1. Edna, você tem toda razão.O Caminho Novo e o seu entorno precisam ser preservados. Quem não se importa, ou desconhece, ou desvaloriza sua história corre o risco de perder [para sempre] a memória de seu povo...

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